Uma manhã de oração, fraternidade que reuniu centenas de pessoas para agradecer e pedir bênçãos aos trabalhadores e trabalhadoras, assim foi a 49º Missa do Trabalhador e da Trabalhadora, em horna a São José Operário, na Praça da Cemig, em Contagem.
A liturgia, promovida pela Região Episcopal Nossa Senhora Aparecida contou com a presença das comunidades de fé da região, integrantes de movimentos sociais e também autoridades públicas, como a Prefeita de Contagem, Marília Campos.
Durante a missa, Dom Nivaldo destacou o legado de Papa Francisco (confira a íntegra da homilia):
Irmãs e irmãos na fé:
1. Convido a todas e todos a um minuto de silêncio reverente e orante, em memória da páscoa definitiva do nosso amado Papa Francisco (…) neste sexto Novendiali (novenário) – ciclo de nove dias que prepara o caminho litúrgico e espiritual para o conclave, após a celebração das exéquias do Papa, ocorrida sábado passado, 26 de abril de 2025. Peregrinos da esperança, avancemos com Jesus, Vivo e Ressuscitado, e rezemos para que o seu Espírito Santo ilumine a eleição do novo Papa, que continuará a servir a Cristo e a Igreja. Somos a Igreja Católica – Igreja Sinodal – capaz de ouvir e caminhar junto. Estamos vivendo o Ano do Jubileu Ordinário da Esperança! Queremos agradecer a Nosso Senhor por sua Encarnação e a Salvação que veio nos trazer. Agradecemos igualmente a alegria da nossa fé e a alegria de pertencer a Igreja, nossa Mãe, pelo Batismo.
2. O Papa Francisco – ao contrário do que já li nestes dias –, devolveu a Igreja aos católicos porque pôs Jesus Cristo no centro. É Jesus Cristo, Vivo e Ressuscitado quem Reina Glorioso, pois é Ele a Cabeça da Igreja, da qual somos membros, filhos e filhas de Deus, irmãos e irmãs uns dos outros. A a missão que o Papa Francisco realizou foi testemunho desta verdade. Ele o fez com a sua vida doada, no seu pontificado de doze anos. Imitando a Jesus, despiu-se de todas as pompas e privilégios, renunciou à ganância do dinheiro e da vida burguesa de um “mundo de corte”, autorreferencial e clerical, e se colocou a serviço da evangelização, priorizando as periferias humanas e geográficas, como também o cuidado com a casa comum. Incansável trabalhador até o fim, não obstante suas fragilidades humanas sempre presentes, lutou pela vida e pela paz, denunciando as guerras e o uso das armas, e apostando no diálogo, no respeito ao outro e na fraternidade universal.
3. Hoje é a festa de São José Operário e o Dia da Trabalhadora e do Trabalhador. Um aspeto que caracteriza São José – e tem sido evidenciado desde os dias da primeira encíclica social, a Rerum novarum de Leão XIII – é a sua relação com o trabalho. São José era um carpinteiro que trabalhou honestamente para garantir o sustento da sua família. Com ele, Jesus aprendeu o valor, a dignidade e a alegria do que significa comer o pão, fruto do próprio trabalho.
4. Estamos aqui nesta praça, agora, para celebrar a “49ª Missa da Trabalhadora e do Trabalhador” – uma tradição às vésperas de seu jubileu de ouro em 2026. Queremos para rezar por todas e todos os trabalhadores. Por todos. Como fez Francisco, rezar uns pelos outros, para que não falte trabalho a ninguém e que todos sejam pagos com justiça e se beneficiem da dignidade do trabalho e da beleza do descanso.
5. Nesta Eucaristia recebemos o precioso alimento que é a Palavra de Deus. Ouvimos: «E Deus criou» (Gn 1, 27). Um Criador. Criou o mundo, criou o homem, e deu ao homem uma missão: administrar, trabalhar, continuar a criação. O termo “trabalho” descreve esta atividade de Deus: «Tendo Deus acabado no sétimo dia a obra que fizera, descansou de todo o seu trabalho» (Gn 2, 2). Ele confia esta atividade ao homem: “Tendes de fazer isto, conservar aquilo, trabalhar para criar comigo – como se tivesse dito assim – este mundo, para que continue» (cf. Gn 2, 15.19-20). Assim, o trabalho é a continuação da obra de Deus: o trabalho humano é a vocação do homem recebida de Deus no fim da criação do universo.
6. Mas, o primeiro homem desobedeceu a Deus e iniciou um processo inverso ao da criação. Por isso, Deus enviou ao mundo o seu Filho – o Homem Novo – para levar a cabo a obra da criação, com a redenção. Porém, o Verbo que se fez carne, não foi acolhido. Foi rejeitado, como acabamos de ouvir: «Não é este o filho do carpinteiro?» (Mt 13, 55). Ele, Filho de Maria, por obra do Espírito Santo, na realidade, não é mesmo filho do carpinteiro (1,18-25). Como é incrível que considerem como óbvias, coisas que não o são! Para a mentalidade comum, se Jesus fosse filho de um personagem importante, teria mais credibilidade. Contudo, Jesus foi apenas percebido como filho de um carpinteiro. Jesus foi percebido, ele mesmo, um trabalhador (Mc 6,3). Por isso perguntaram: o que Ele pretende? Jesus não foi aceito pelos seus em sua carne. Não aceitaram a fraqueza de sua humanidade. Não acolheram sua humanidade crucificada. Eis a própria raiz da fé, sempre ameaçada no presente, como no passado.
7. Também hoje existem várias formas de nos escandalizar com um Deus que entra na nossa história por meio da história individual e pessoal de Jesus. Esvaziam, assim, a salvação de Deus, não reconhecendo a sua carne e a sua cruz, salvação de toda a carne e de toda a cruz. “O que não é assumido, não é redimido” (S. Irineu). “Cardo salutis caro”: a sua carne é o essencial da salvação.
8. O Papa Francisco, com a Carta Apostólica “Patris Corde”, proclamou um Ano especial de São José de 8 de dezembro de 2020 a 8 de dezembro de 2021 e convidou-nos a olhar para o santo, de quem “Jesus aprendeu o valor, a dignidade e a alegria do que significa comer o pão fruto do próprio trabalho”. Fez isso para chamar a atenção do mundo inteiro para a luminosidade da Palavra de Deus: «Viu Deus que tudo quanto tinha feito era muito bom» (Gn 1, 31). Deus criou a mulher e o homem à sua imagem e semelhança. Por isso, o trabalho torna a mulher e o homem semelhante a Deus, pois com o trabalho o ser humano é criador, é capaz de criar, de criar muitas coisas; até mesmo de criar uma família para seguir em frente.
9. Na verdade, o ser humano é criador e cria com o trabalho. Esta é a sua vocação. O trabalho tem em si uma bondade e cria a harmonia das coisas – beleza, bondade – e envolve o homem em tudo: no seu pensamento, na sua atuação, em tudo. O homem participa no trabalho. É a primeira vocação do homem: trabalhar. E isto dá dignidade ao homem. A dignidade que o faz assemelhar-se a Deus é a dignidade do trabalho. Mas, a dignidade do trabalho infelizmente é tão espezinhada. Na história, lemos a brutalidade que fizeram com os escravos: foram levados, (“qual barbárie!”), da África para a América.
10. Ainda hoje há muitos escravos, homens e mulheres, que não são livres para trabalhar: são obrigados a trabalhar para sobreviver. São escravos: fazem o trabalho forçado…, injusto, mal pago e que leva o homem a viver com a dignidade espezinhada. Pensemos nas trabalhadoras e nos trabalhadores, diaristas, indicados a trabalhar, por um salário mínimo não de oito, mas doze, quatorze horas por dia: isto acontece. É real! Pensemos nas trabalhadoras e trabalhadores (empregadas domésticas, catadores de papel, servidores informais) que não recebem um salário justo, não tem assistência da segurança social e nem sequer a possibilidade de se aposentar: isto é real! Acontece.
11. Toda a injustiça que se faz a uma pessoa que trabalha, espezinha a dignidade humana; inclusive a dignidade daquele que comete a injustiça: abaixa-se o nível e gera a tensão de ditador-escravo. Ao contrário, a vocação que Deus nos dá é tão bonita: criar, recriar, trabalhar. Mas isto só pode existir quando as condições são adequadas e a dignidade da pessoa é respeitada, o que não parece acontecer no nosso tempo. Atualmente, o “trabalho” parece ser uma urgente questão social e o desemprego atinge por vezes níveis impressionantes, mesmo em países onde se experimentou durante várias décadas um certo bem-estar. É urgente tomar renovada consciência do significado do trabalho que dignifica e do qual São José é patrono e exemplo.
12. O trabalho de São José lembra-nos que o próprio Deus feito homem não desdenhou o trabalho. A perda de trabalho que afeta tantos irmãos e irmãs, deve ser um apelo a revermos as nossas prioridades. O trabalho torna-se participação na própria obra da salvação, oportunidade para apressar a vinda do Reino, desenvolver as próprias potencialidades e qualidades, colocando-as ao serviço da sociedade e da comunhão – uma oportunidade de realização não só para o próprio trabalhador, mas sobretudo para aquele núcleo originário da sociedade que é a família. Uma família onde falte o trabalho está mais exposta a dificuldades, tensões, fraturas e até mesmo à desesperada e desesperadora tentação da dissolução. Portanto, como poderemos falar da dignidade humana sem nos empenharmos para que todos, e cada um, tenham a possibilidade dum digno sustento?
13. A crise do nosso tempo, que é econômica, social, cultural e espiritual, pode constituir para todos um apelo a redescobrir o valor, a importância e a necessidade do trabalho para dar origem a uma nova «normalidade», em que ninguém seja excluído. A pessoa que trabalha, seja qual for a sua tarefa, colabora com o próprio Deus, torna-se criadora do mundo que a rodeia.
14. Unamo-nos hoje a muitos homens e mulheres, crentes e não-crentes, que comemoram o Dia do Trabalhador, da Trabalhadora, o Dia do Trabalho, por aqueles que lutam pela justiça no trabalho. Rezemos por aqueles – bons empresários – que realizam o trabalho com justiça, mesmo que tenham prejuízo, e não querem despedir ninguém: “Pois despedir um trabalhador/trabalhadora é despedir-se”.
15. “Imploremos São José Operário – lê-se na Patris Corde – para que encontremos caminhos que nos comprometam a dizer: nenhum jovem, nenhuma pessoa, nenhuma família sem trabalho”. E peçamos a São José – com esta imagem colocada junto do altar, tão bonito, com as ferramentas do trabalho nas mãos – que nos ajude a lutar pela dignidade do trabalho, a fim de que haja trabalho para todos e que seja um trabalho digno. Não trabalho escravo. Que esta seja a oração de hoje!
† Nivaldo dos Santos Ferreira
Auxiliar de Belo Horizonte
Oração a São José no dia
“Ó São José, Padroeiro da Igreja, vós que, ao lado do Verbo encarnado trabalhastes todos os dias para ganhar o pão tirando d’Ele a força para viver e labutar; vós que experimentastes a ansiedade do amanhã, a amargura da pobreza, a precariedade do trabalho: vós que irradiais hoje, o exemplo da vossa figura, humilde perante os homens, mas grandíssima diante de Deus, protegei os trabalhadores na sua dura existência quotidiana, defendendo-os do desânimo, da revolta negadora, bem como das tentações do hedonismo; e preservai a paz no mundo, aquela paz que, por si só, pode garantir o desenvolvimento dos povos.
Amém.”
(São Paulo VI, 1° de maio de 1969).